JOVEMGUARDA.COM.BR - O Portal da Música Jovem!
Artigos

Vida e Obra de
Johnny McCartney




Vinte e cinco anos depois de algumas de suas faixas terem sido censura­das e consequentemente arquivadas pela diretoria da velha CBS, e um ano depois das masters originais terem sido encon­tradas no arquivo da Sony Music, "Vida & Obra de Johnny McCartney", terceiro álbum solo de Leno, co-produzido por Raulzito Seixas, chega ao mercado via lançamento in­dependente do próprio Leno, através de sua recém­ inaugurada Natal Records. Conheçam a história.


A carreira de Gileno Azevedo começou muito cedo. Amigos de infância, os adolescentes Leno e Lilian Knapp formaram uma dupla para fazer du­blagens de sucessos internacionais na antiga TV Rio, cujo auditório ficava a poucos metros do pré­dio onde moravam no Posto Seis. Lilian come­çou a namorar Renato Barros (do grupo Renato e seus Blue Caps) e, quando do estouro da Jovem Guarda no final de 65, este resolveu levá-Ios para a CBS, uma vez que não existia em nosso cenário uma dupla formada por um casal de jovens.

O primeiro compacto - Pobre Menina/ Devol­va-Me - foi sucesso absoluto quando lançado em 1966, principalmente por ter colocado em 1º lu­gar ambos os lados do disquinho. A dupla co­meçou a fazer canções e versões para os outros grandes nomes da Jovem Guarda - Jerry Adriani, Ed Wilson, Renato e seus Blue Caps e Wanderléa - e, ao lançarem seu primeiro álbum, "Leno e Lílian" (1966), jogaram mais um sucesso na parada naci­onal: Eu Não Sabia Que Você Existia.

O ano seguinte serviu para colher os louros do sucesso, com o lançamento de mais um ál­bum - "Não Acredito" (1967), que trouxe a famo­sa versão hrasileira para o clássico dueto de Frank Sinatra e sua filha Nancy - Coisinha Estúpida, além da faixa título Não Acredito, versão do sucesso dos Monkees, I'm a Believer. Quando a dupla optou por separar-se no início de 1968, Leno foi imediatamente contratado como artista solo e gravou seu primeiro álbum - "Leno", que o levou novamente ao topo da parada com A Pobreza. imediatamente regravada em italiano e es­panhol para lançamento no exterior. Papel Picado foi um outro sucesso daquele primeiro álhum, que foi sucedido pelo não menos importante "A Festa dos Seus 15 Anos" (1969), cuja faixa título é um dos clássicos do final da Jovem Guarda.

Leno conheceu então o jovem produtor Raul Seixas, que viera para o Rio e consequentemente para a CBS através de Jerry Adriani. Raulzito e sua banda haviam gra­vado um disco pela Odeon mas o mesmo fora mal produzido e pessimamente divulgado. Ele buscava compor, tocar e cantar, mas seu emprego era apenas de produtor. Os amigos começaram a gravar suas músicas e Leno foi um dos primeiros, aproveitando Sha-La-La no início de 1970. Depois de participar do V Festival Internaci­onal da Canção Popular com A Última Vez Eu Que Vi Rozane, Leno entrou no estúdio com os amigos Raulzito e Renato, para gravar um novo álbum. Consciente de que a Jovem Guarda já era passado e que os anos 70 acenavam com uma nova perspectiva para o rock nacional, Leno re­solveu colocar num disco toda a cultura musical que adquirira mundo afora.

O álbum "Vida & Obra de Johnny McCartney" foi concebido como um divisor de águas que Leno pretendia imprimir à sua carreira. Vivendo as mudanças sonoras e comportamentais que a música pop conferia ao final da década, suas novas composições apontavam para novos rumos. Tendo a seu lado um amigo e produtor como Raulzito Seixas, Leno reuniu um forte repertório e convidou músicos de peso para acompanhá-lo nas sessões, realizadas entre o final de 1970 e o início de 1971. Para um artista que poderia rer se acomodado à série de hits sucessivos que vinha cultivando no mercado, um ousado passo como esse só seria possível para um músico cuja integridade e sinceridade artística o fizessem correr riscos. Leno correu e pagou o preço. Quando metade das letras do disco foram vetadas pela censura da época, a CBS resolveu ouvir o que vinha sendo gravado e, ao verificar que aquilo fugia aos padrões comerciais vigentes no mercado, determinou o arquivamento do projeto. Pouco depois, quando Leno mudava para a Polydor, foi informado de que os tapes seriam apagados...

Vinte e cinco anos depois, quando eu estava realizando uma pesquisa aprofundada no arquivo de tapes da atual Sony, com vistas ao lançamento de um livro sobre a Jovem Guarda, deparei-me com duas caixas empoeiradas, em cujas etiquetas constavam músicas de Leno das quais nunca ouvira falar. Liguei para um artista e ganhei um amigo. Primeiro disco gravado em 8 canais no Brasil, "Vida & Obra de Johnny McCartney" foi mixado digitalmente a partir das fitas originais. Verdadeiro elo-perdido do rock brasileiro, com faixas que antecipam diversas tendências exploradas nos anos seguintes, este lançamento é coisa do destino!



AS FAIXAS

Foto do booklet do CD

1) Johnny McCartney - Abrindo o disco, a faixa-título é um rock'n'roll básico, com uma bem-humorada letra sobre o estrelato (escrita por Leno e Raulzito), e que foi uma das quatro faixas gravadas com A Bolha.

2) Por Quê Não? - Também com A Bolha, traz uma letra anti-conformista e antecipa o tipo de rock pesado que grupos nacionais tornariam popular nos anos setenta. Raulzito e Renato Barros fazem os backing vocais.

3) Lady Baby - Escrita por Raulzito e Carlos Augusto, é uma balada a la McCartney - no melhor estilo de Eleanor Rigby, seja no arranjo Martiniano para as cordas, seja na letra que analisa a solidão. Destaque para o Trio Ternura nos backing vocais e para as variações instrumentais ousadamenre anacrônicas, que dão cores a este delicado clip poético.

4) Sentado No Arco Íris - Terceira música com A Bolha, com o som pesado que o Cream tirava em seus clássicos, foi a primeira parceria de Leno e Raulzito pra o disco e foi considerada por Raulzito, na época, a primeira letra de que se orgulhava. Apesar de ter sido uma das mais vetadas no disco em função de seu tema iconoclasta, a música conseguiu driblar a censura e se inscrever no FIC da Rede Globo de 1971. Raulzito e Renaro Barros novamenre comparecem nos backing vocals.

5) Pobre do Rei" - Bela balada de Marcos Valle, com uma irônica letra de Paulo Sérgio Valle em cima dos donos do poder. É interessante constatar a sua contemporaneidade. Outra vetada pela cen­sura. Destaque para o piano elétrico de Marcos Valle e para os backing vocals dos Golden Boys.

6) Peguei Uma Apollo - Este rock'n'roll da melhoor estirpe, escrito por Arnaldo Brandão, fazia parte do repertório de A Bolha quando Leno e Raulzito asistiram a um de seus concertos no clube Monte Líbano, na zona sul do Rio de Janeiro. Convidados para participar do disco nos bastidores daquele show, os rapazes gostaram da idéia de Leno gravá-Ia. Guarda em sua estrutura uma saudável inspiração stoniana.

7) Sr. Imposto de Renda - Rápida vinheta con­tra a taxação no "país que vai prá frente", esta música foi censurada e, por sua gozação aos pseudo-gênios da economia, pode ser conside­rada a nossa Taxman. Gravada acusticamente por Leno, Raulzito e Renato Barros.

8) Não Há Lei Em Grilo City - Este premonitório country-rock já alertava para a violência urbana. Foi uma das censuradas e, com a participação dos Shakers, ganhou um arranjo instrumental não muito diferente do estilo registrado pelo próprio Raul Seixas, em seus primeiros discos, poucos anos mais tarde.

9) Convite Para Ângela - Outra parceria de Leno e Raulzito, traz no arranjo o despojamento de seu ins­trumental acústico, como numa roda de violão entre amigos. Destaque para Raulzito no violão e nos backing vocals, além de Renato e Paulo César Barros.

10) Deixe O Tempo Me Levar - Hiper sentimen­tal, esta canção traz um belo arranjo para piano e orquestra, com seus versos intimistas que invo­cam a maturidade. Teve ironicamente o solo vo­cal gravado pela primeira vez em janeiro de 1995, com a letra e a instrumentação originais. Belíssimos os backing vocais dos Golden Boys.

11) Contatos Urbanos - Composição do maes­tro Ian Guest, tem a forte presença dos Shakers na base e do Trio Ternura nos backing vocals. Gravada durante as sessões do LP, entraria num single jamais lançado.

12) Bis - Parceria original de Leno e Raulzito, fecha a concepção do disco e leva a um rápido bis da faixa título. Leno toca com Raulzito e com Renato e seus Blue Caps.

Animado com os trabalhos em seu "Johnny McCartney". Leno teve acesso às matrizes das ses­sões de Leno e Lilian e aproveitou para remixar digitalmente seus maiores sucessos, preparando um segundo CD da Natal Records: "Antologia 1966-1967", que chega ao mercado junto com "Johnny McCartney" e nos brinda com as 20 prin­cipais músicas da dupla.