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Rogério Duprat e Sua Ligação com o Rock'n'roll


Albert Pavão

Todos aqueles que apreciam boa música tiveram uma notícia triste no final de outubro passado. É que o maestro Rogério Duprat faleceu no dia 26, em São Paulo, aos 74 anos, por complicações de um câncer na bexiga. Já há alguns anos Duprat estava afastado dos estúdios em razão de uma surdez provocada pelo excesso de horas à frente de gravações. Antes disso, ele havia passado a produzir jingles no estúdio Vice Versa, de São Paulo, ao lado de Gutenberg Guarabira.

Logo após seu falecimento, diversos obituários foram publicados nos principais jornais e revistas do país, salientando na biografia do maestro, a enorme importância que ele teve no surgimento do tropicalismo, principalmente a partir de seu arranjo para a canção "Domingo no Parque", que Gilberto Gil defendeu, juntamente com Os Mutantes no Festival da Canção da TV-Record, de 1967 - considerado o melhor arranjo do festival. Alem disso, nos anos seguintes, a participação de Duprat no movimento tropicalista foi intensa, tendo feito arranjos e composições para várias canções do álbum "Tropicália", para discos diversos dos Mutantes - muitos o consideram o "George Martin" dos Mutantes - e até para canções de Chico Buarque e Jorge BenJor, entre outros, destacando-se sua contribuição para o LP de Erasmo Carlos, de 1971.

Na sua biografia, descobre-se que ele nasceu no Rio de Janeiro em 7/2/1932 e em 1955, sua família mudou-se para São Paulo, onde ainda jovem passou a ser um dos destaques da Orquestra Sinfônica Municipal, tocando violoncelo. No começo dos anos 60, sempre preocupado em inovar, estudou música com Pierre Boulez e Karlheinz Stockhausen e ficou conhecendo o americano Frank Zappa, um idealista como ele. No início de 1963, juntamente com o maestro Damiano Cozzella, usou um computador IBM 1620, da Escola Politécnica da USP para tentar compor música. Também compôs para trilhas sonoras de filmes, destacando-se três produções de Walter Hugo Khouri: "A ilha", "Noite Vazia" e 'Corpos Ardentes".

Apesar de tanta informação sobre o maestro, um período passou desapercebido de pesquisadores e jornalistas. Foram os meses entre o segundo semestre de 1963 e boa parte de 1964, quando tive a satisfação de conhece-lo e conviver com ele em estúdio.

Nesse período ele foi dirigir a parte artística de uma novíssima gravadora paulista, a "VS" (Som Indústria Vilela Santos Ltda.) e contratou todo um elenco de cantores e cantoras, inclusive este escriba, então um jovem de 20 anos de idade que usava o nome artístico de Albert.

A "VS" entrou no mercado fonográfico com muita ambição e era dirigida pelo radialista Ataliba Santos, juntamente com o empreendedor Paulo Vilela. Tinha dois selos: Penthon para a produção de LPs que seriam vendidos a domicílio no melhor estilo da Imperial (da Odeon) e o selo VS, que lançaria os discos compactos e LPs do pessoal do elenco da gravadora.

Rogério Duprat começou seus trabalhos produzindo para a Penthon, o primeiro LP chamado "Distração" com a Orquestra Fantasia (ás vezes chamada de Rudá e sua orquestra) - músicos de estúdio sob sua regência- que era um pastiche contendo 12 músicas, sendo oito orquestrais com arranjos dele, duas com o cantor Dave Gordon e duas com Albert e The Hits. A seguir viria o antológico "Clássicos em Bossa Nova", que foi uma novidade muito bem recebida na época, e que só não teve maior repercussão devido à pequenez da gravadora e à pouca divulgação.

Na "VS", Duprat veio a produzir o meu compacto simples. Dentre as diversas músicas que levei para ele ouvir, ele escolheu duas versões: "Vigésimo andar" (20 flight rock) e "Sobre um rio tão calmo" (Lazy River). Rogério Duprat fez arranjo para as duas, que eu gravei com conceituados músicos de estúdio de S.Paulo: Boneca e Heraldo do Monte nas guitarras, Xu Viana no baixo rabecão e Dirceu na bateria.

O lado A do meu compacto, "Vigésimo andar" é uma música muito simples, com três acordes básicos, como todo rock and roll dos anos 50. É de autoria de Eddie Cochran e Fairchild e foi sucesso com o primeiro, tornando-se um clássico do rockabilly, pois teve inúmeras gravações em inglês, francês, italiano, espanhol, português, alemão, etc..por gente dos anos 50 a 90 como Cliff Richard, Paul Mc Cartney, Johnny Halliday, Little Tony, Vince Taylor, Stray Cats, Dave Edmunds e Darrel Higham, entre outros.

Só que, ao contrário do que era comum naqueles anos, de se copiar o arranjo da gravação original, Duprat fez algumas modificações no seu, que tornou-o bastante diferente, pois ele transformou a primeira parte da música, de maior para tom menor, alem de torna-la um pouco mais lenta e mais jazística.

O resultado não poderia ter sido melhor, pois "Vigésimo andar" foi o compacto simples mais vendido da "VS" e um dos mais executados pelas rádios de São Paulo no 1º semestre de 1964.

Registre-se que, depois desse arranjo, Rogério Duprat também fez o de 'Boogie do Guarda", gravada por Baby Santiago, conhecido compositor da cena pré-jovem guarda de S.Paulo, que nessa época já era conhecido pela autoria de "Bata Baby", 'Rock do Sacy', 'Adivinhão" e "A Bruxa".