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Entrevista

Reginaldo Rossi
No auge da Rossimania que recolocou Reginaldo Rossi na boca do povo, de norte a sul do país no final dos anos 90, o cantor e compositor pernambucano recebeu Marcelo Fróes no hotel em que estava hospedado em Copacabana, para uma entrevista exclusiva para o International Magazine. Realizada no dia 25 de março de 1999, a entrevista tem excelentes momentos sobre o início da carreira do cantor e sobre os anos 60 e a música brega. Confira a seguir.


Como está você, Reginaldo?
Eu estou ótimo, sabe? Até por­que, além do meu trabalho, eu sem­pre estive ótimo comigo mesmo... mas estava muito triste com a falta de apoio de um monte de pessoas e isso dependia do começo da mi­nha gravadora. De um tempo pra cá, a minha gravadora tá me dando todo esse apoio e aí as outras pes­soas então se juntaram e agora es­tão todos me apoiando. Com isso, a gravadora me leva a todos os apresentadores de televisão e eles me recebem maravilhosamente bem. Então eu estou super bem.

Já que você tocou no assun­to de gravadora, no ano passado você fez um disco pela Sony e agora está lançando este disco ao vivo. Como estava a coisa antes?
Eu nunca fiquei parado, dia ne­nhum. Nem em termos de disco, mas o problema é o seguinte: veja bem, eu fiz 10 discos pra Odeon e ganhei 10 discos de ouro... numa época em que era muito mais difícil vender. Eu vendia 150, 170 mil dis­cos numa época em que era muito mais difícil vender 150 mil do que 1 milhão e meio hoje. Então, além de estar restringido a um espaço, só do Norte e Nordeste, eu vendia 150 mil - o que hoje representa 1 milhão e meio, tranqüilo. Então teve um tempo em que eu não quis mais fa­zer com gravadora. Eu fazia inde­pendente, porque na Odeon eu fi­quei de 80 a 90 e aí eu fiz uns 3 discos independentes. Eu fiz um pri­meiro, vendi 150 mil. Mas é aquilo, você sempre quer estar em São Paulo.

Esses 3 discos independen­tes também estão sendo relançados em CD pela EMI?
Não, eles foram relançados pela Polydisc, que é lá do grupo da Condil e da Aky Discos. Então sem­pre vendemos mais do que 150 mil. A EMI vai relançar somente os dela. Então, quando foi o ano passado, João disse: "Olha, vamos fazer um contrato com a Sony". E fizemos, mas eu perguntei: "Você acha que é bom? Eu não quero mais..." Aí, pra você sentir como são as coisas, nós vendemos e eu liguei pra Sony dizendo que precisava de um di­nheiro. Aí eu ouvi: "Pô, tu nem ven­deste pra pagar o custo do disco!" Aí o disco foi vendendo 30 mil, 40 mil, 50 mil, 100 mil, 150 mil... Eles não venderam 500 mil porque eles não botaram o disco no Rio e em São Paulo. Se eles só tivessem co­locado o disco no Rio e em São Paulo, tinham vendido 500 mil. Aí venceu o contrato e eu disse: "Ago­ra eu quero sair porque eu não que­ro nem mais ver gravadora!' Mas aí pintou Paradoxx, Universal, PolyGram e um monte de gravado­ras. O sucesso estava aumentan­do, principalmente na Bahia. O meu mercado estava aumentando, ain­da agora fiquei sabendo que o record de shows na Bahia é de Reginaldo Rossi. Setenta e oito mil pessoas pagaram pra me ver, en­quanto mais de 40 mil voltaram pra casa. A orla marítima fechou, as ruas paralelas também e - parecia que era show de Michael Jackson junto com Rolling Stones! Eu nem acreditava que era show do Rossi. Aí as gravadoras deram e eu não queria mais, porque eu achei que sempre iria ser o mesmo papo. Na hora em que assinam o contrato é "nós vamos fazer isso, aquilo e aqui­lo outro", mas depois que você as­sina os caras nem te ouvem. Aí nós conversamos bastante e tudo bem. Lançamos o disco ao vivo, que já saiu com 107 mil cópias vendidas. O disco foi gravado lá no Nordeste e até foi lançado às carreiras por­que as fitas piratas minhas vendi­am aos montes. Porque ao vivo eu sou muito mais forte do que no dis­co. Os caras que fazem shows le­vam decks, o próprio operador fa­zia isso. Não havia como controlar, e hoje também não há como. No começo a gente se preocupou, que­brava deck e brigava com os caras. Só que os caras gravam de qual­quer forma e isso me promoveu demais. E há muito tempo que você que um monte de pessoas são meus fãs e me pedem um disco ao vivo. Eu nem tinha mais coragem de falar com a gravadora pra fazer um disco ao vivo. Aí, quando se lançou esse CD, pensávamos que a pira­taria iria diminuir... mas aumentou. Antes de eu fazer o disco ao vivo, já tinha um monte de CD pirata ao vivo. Aí a Sony falou: "Vamos fazer agora!" João Florentino, que é o pai do disco, também disse pra fazer­mos já. Fizemos, gravamos aqui e acolá e melhoramos no estúdio. An­tes de sair, já tinha ganho disco de ouro. Já ganhou disco de platina e já ganhou disco de platina duplo. E é agora que está entrando em São Paulo e no Rio. Então, sonhávamos com 1 milhão e já estamos sonhan­do com 2 milhões de discos.

E a expectativa é a de que toda a sua discografia acabe sen­do relançada, né?
A EMI está relançando tudo, até porque o Garçon é tão forte, mas tão forte, que a Odeon lançou a série "Meus Momentos" e ninguém vendeu tanto. De todos os grandes astros da Odeon, ninguém vendeu 50 mil e o Garçon vendeu 300 mil. De todos os artistas foram lançados volumes da série "Meus Momentos", mas o volume de Reginaldo Rossi foi o primeiro da lista. Foi o que mais vendeu, daí o interesse de relançar a coleção. Vão sair todos, graças a Deus.

Você começou pela Continen­tal, né?
Sim, mas no selo Chantecler. Gravei três LPs lá, mas tão relançando tanto que eu nem sabia que dois daqueles discos já sairam num CD "dois em um". Aí em 1970 eu fui pra CBS, onde eu gravei cin­co LPs. Depois eu gravei um na Copacabana, que acho que está sa­indo junto com os CDs da Odeon porque a EMI comprou a Copacabana. Até porque este dis­co tem muitas músicas boas. Depois da Copacabana pintou justamente a fase de "cantor que toca em AM" e de "cantor que não toca em FM". Essa coisa toda começou justamen­te tipo em 1975, quando a CBS quis que eu mudasse de estilo. "Olha Rossi, o segmento de mercado ago­ra é outro e não sei o quê, blá blá blá". Eu disse "que nada" mas, como eu tinha formação universitária, eles queriam que eu fizesse uma coisa .mais sofisticada. Eu disse: "Não, minha praia não é essa!" Aí fiquei sem gravar, e foi justamente quan­do gravei um disco pela Copacabana. Mas isso depois de dois anos, porque fiquei preso num contrato e eles nem queriam que eu gravasse o que eu queria e nem me liberavam. Quando eles me libera­ram, eu fiz um LP pra Copacabana - que vendeu muito bem mas não aconteceu, porque a gravadora não mostrou. Aí eu pensei: "Não quero mais papo com gravadora!"

Como foi sua experiência no mercado independente?
Não ganhamos muito dinheiro, até porque eu fiz meu disco inde­pendente em 1993 com um amigo meu - um rapaz que conhecia há 30 anos e que eu quis ajudar. Ape­sar da fragilidade do trabalho, con­seguimos vender umas 60 mil cópi­as e aí o João o comprou e o relançou em CD pela Polydisc. Che­gamos a cento e tantos mil e foi nes­sa transição que apareceu a Sony.



Como foi seu início de carrei­ra, quando você foi para São Pau­lo e foi contratado pela Chantecler?
Olha, eu sempre fui um privile­giado. Talvez até porque eu tenha muito talento. Só faltava o pessoal da gravadora saber... Eu cantava em Recife, fazia um movimento pa­ralelo à Jovem Guarda. Era uma Jovem Guarda regional, a gente ti­nha um conjunto chamado The Silver Jets - já que, naquele tempo, era tudo em inglês. Não gravei nada com eles, nós chegamos até a acompanhar uma artista de lá cha­mada Sonny Delanie. Era difícil gra­var, mas ela era namorada de um divulgador e aí conseguiu gravar um disco. E nós a acompanhamos na Mocambo, mas o conjunto se des­fez e eu comecei a cantar sozinho. Aí pintou o Roberto escrevendo em português, porque até aí era tudo em inglês. Era Elvis, Animais e Beatles. Roberto começou a cantar em português o rock da época, que era o iê-iê-iê. Aí eu fiz uma música chamada O Pão, que foi o maior su­cesso do Nordeste. Tanto que foi gravada pelo rei da juventude, que na época não era o Roberto e sim o Sérgio Murilo. Foi justamente quan­do o Sérgio saiu que entrou o Roberto.

É, mas não terá o Sérgio saí­do por causa da aparição do Roberto? Na época, ele reclamou muito na imprensa, culpando Roberto por sua decadência.
Eu não acho que ele tenha sido prejudicado pelo Roberto, eu acho que ele foi prejudicado pelo modo de viver. Eu me lembro de a história ser mais ou menos no sentido dele ter ido pro Peru ou pra Bolívia em excursão. Ele tinha que voltar pra cuidar dos negócios aqui, já que ele era o rei... mas ele estava pra lá Por sinal, tem uma frase que o Roberto diz e eu aí o defendo com unhas e dentes: "Eu não entrei na Jovem Guarda, eu fui entrado!" Por­que, se eu não me engano, os pia­nos eram para um outro cara... e o Roberto foi se promovendo. Então, como é que se faz? Possivelmente teria sido o Sérgio Murilo, mas ele não estava aqui. Era Roberto, en­tão foi Roberto. Eu acho que a coisa é por aí, o processo foi esse.

E quanto a você?
O representante da Chantecler em Recife me viu e disse: "Olha, nós temos um cara aqui em Recife que é foda!" Eu vim pra São Paulo pra fazer um teste, a Chantecler me trouxe. Naquele tempo, você grava­va um compacto simples, depois outro compacto simples, depois um compacto duplo e depois sim um long play. Quando eu cheguei no corpo de produção, eles me disse­ram: "Olha, o tal do Pão a gente já sabe que é sucesso. Mostra aí a mú­sica para o outro lado". Eu mostrei e, como naquele tempo tinha a coi­sa de se gravar uma boa no lado A e de se empurrar qualquer coisa no lado B, então o cara disse: "Pô, dei­xa essa pro segundo compacto! Mostra outra!" Eu mostrei e o cara disse: "Essa é pro terceiro compac­to!" Aí, quando eu mostrei a quarta música, o cara disse: "Vamos fazer um long play!" Então possivelmen­te eu não sei quem começou com um long play, exceto Rossi. Porque ninguém gravava, era esse o pro­cesso. Eu gravei um LP e voltei pra Recife. O LP era chamado "O Pão", numa época em que Marcos Roberto tinha esse apelido. Sérgio Murilo regravou a música, depois José Roberto também. José Roberto era um baiano que regravava os grandes sucessos pra CBS. Nós voltamos e, como eu me tornei a estrela máxima ,de lá, sem­pre que o Roberto ia lá eu esquen­tava seus shows. Então, quando foi em 1967, eu fiz um show e lá na­quele tempo as pessoas nem se­quer aplaudiam direito na televisão. Ia todo mundo de paletó e gravata. Eu cantei O Pão e o auditório aplau­diu e pediu bis, lá no auditório da TV Jornal do Commércio. Eu cantei de novo e eles ficaram de pé. Era uma coisa do outro mundo aplaudir de pé. Aí o empresário do Roberto, que era Geraldo Alves, me viu e dis­se: "Olha moleque, quando você for pra São Paulo eu cuido de você" Eu já tinha gravado um LP, que tinha acontecido no Norte e no Nordeste todo. Menos em São Paulo e no Rio, que eram a Meca. Ele nem sabia, tanto que eu fui pra São Paulo e fui contratado pela TV Record. Eu fa­zia "Jovem Guarda", "Pequeno Prín­cipe", "Show em Simonal", "Corte e Rayol Show" e essas coisas. Foi por aí.

Como foram os seus dois ou­tros discos pela Chantecler. Foram ainda dentro da Jovem Guar­da?
Sim, aí eu fiz ainda no espírito da Jovem Guarda. Eu sou a mesma coisa até hoje e talvez eu esteja com essa bola até porque agora os ditos bregueiros estão loucos para que eu estoure. Estão me chaman­do de Moysés, porque Moysés guiou seu povo no Egito e eles es­tão querendo que o Rossi abra o es­paço. Como eu estou tocando bem, então as gravadoras vão lembrar. De um tempo prá cá, ficou muito axé e pagode.

Você acha que está vindo uma nova onda de brega?
Eu acho... liderada por Reginaldo Rossi.

E esse brega, que começou nos anos 70? A passagem da Jo­vem Guarda pros anos 70 gerou o início do brega. Por que virou brega?
Primeiramente, nunca existiu o brega.

Ah peraí, muitos artistas do brega surgiram na Jovem Guar­da e, ao entrarem pra música ro­mântica, criaram uma panela de brega.
Mas isso sempre foi assim, nin­guém mudou nada não. O que acontece é que na Jovem Guarda era todo mundo menino, então tinha uma conotação de rock. É como Chitãozinho, Leandro & Leonardo e Zezé di Camargo & Luciano: é a mesma coisa que nós cantávamos na Jovem Guarda. Mudou só a rou­pagem musical.

... o que é suficiente para que se considere uma coisa brega, não? O Brasil é um país preconceituoso, porque existe uma coisa de Jovem Guarda ser um tanto respeitada e dos anos 70 serem completamente execrados como uma coisa brega e de mau gosto. Eu queria enten­der o que foi que aconteceu, pois o que era "quente" na época ­muito embora fosse combatido na imprensa pelo pessoal da MPB e da Bossa Nova virou brega... Existe uma confusão entre o fim da Jovem Guarda e o início do brega.
O brega nunca morreu, ele sem­pre esteve muito vivo. A mídia é que não dizia isso. Tem um cara que eu amo, chamado Amado Batista, que vendia 1 milhão de discos... Ele co­meçou logo depois da Jovem Guar­da, ele vem de Goiânia. Ele vendia 1 milhão de discos, Odair José tam­bém é de lá. Agora, a gravadora dele é que não tinha peito de dizer que ele vendia mais do que Caeta­no, Gil e tudo junto. Esse é que é o fato. As gravadoras ficaram mantendo isso. Por exemplo, no tempo em que eu gravei na Odeon, o Jorge Davidson era diretor artístico e nun­ca foi no estúdio. Quem sustentava a Odeon era Fernando Mendes, Reginaldo Rossi, José Augusto, Fevers, Evaldo Freire e não sei o quê. O prédio da Odeon ficava na frente e o estúdio lá atrás. Eu en­trava pela garagem e ia pro estú­dio. O diretor artístico da Odeon nunca foi no estúdio. Nós entráva­mos e tinha uma festa lá em cima, tipo coquetel pra Joyce ou pra au­dição do disco da Fátima Guedes. Eu acho que tinha que ter coquetel pro disco da Joyce, coquetel pro dis­co da Nana Caymmi, coquetel pro disco da Fátima Guedes, coquetel pro disco dos Paralamas do Suces­so... e coquetel pro Reginaldo Rossi, pros Fevers e pro Fernando Men­des. Mas eu nunca tive isso. Aí eu comecei a trabalhar e a vender 150 mil, 150 mil... e aí pintou uma tal de "Rossimania". Porque eu levo uma vantagem muito grande na parte cultural: eu canto e hoje em dia 90% do meu público é formado por jo­vens universitários e doutores. O Faustão me mostrou cantando em francês e inglês e eu virei "cult", mas eu já fazia isso quando traduzia can­ções. Hoje talvez o universitário não ache brega ter um disco do Rossi e sim "cult". Rossi é craque, Rossi fez escola de engenharia e fala inglês e francês. Agora, o Rossi optou por cantar músicas que o povo canta. Sabe, às pessoas estão sempre procurando um escudo... mas ago­ra eu também acho que de um tem­po pra cá as pessoas estão mais brasileiras e estão mais soltas. Tan­to que, naquela época, 80% da música era estrangeira e hoje 80% da música é brasileira. Então as pessoas, de um modo em geral, estão com menos medo de dizer que gostam de feijão com arroz, de Odair José e de Reginaldo Rossi. Você está entendendo? Até pesso­as generosas como Caetano Veloso e Gilberto Gil.. Eles não se afasta­ram de ninguém, eles sempre foram colegas carinhosos com todo o pes­soal. Três ou quatro caras da mídia é que queriam formar essa opinião. Se eles declarassem alguma coisa em nosso favor, os caras nem pu­blicavam... mas agora estão publi­cando. Domingo, por exemplo, eu vi uma coisa linda: o Caetano can­tou na Xuxa e aí disse que aquela música já tinha sido sucesso com Tim Maia e Peninha. Me disseram uma vez que, quando eu estava em Salvador, ele declarou que "ia ver o show do Rossi... porque eu gosto daqueles breguinhas que ele faz". Ele sempre foi assim. No dia do Jô, eu estava lá - até emocionado - e vi quando o Gil levantou e disse: "Jô, eu vou dar um abraço ali num cole­ga meu!" Ele chegou junto de mim e me deu um abraço fraternal, aper­tado, e disse: "Você está arreben­tando!"

Essa mentalidade de gravadora a que você se referiu pode não ter mudado tanto, afi­nal a Tiazinha de hoje é a Gretchen de ontem e hoje nin­guém mais quer saber da Gretchen. .
Bem, mas aí todas as pessoas que fizeram música de modismo vão passar. E eu nunca fiz modismo, eu canto "esqueça se ele não te ama" - que é uma música americana, Forget Him. Há uma diferença en­tre o Rossi e a maioria, é claro que há. Eu canto: "Ei, vem cá que eu quero te mostrar/ minha cidade, meu lugar/ Recife tem cantos mil". Tem uma hora que eu digo assim: "Ela é a Veneza desse Brasil, é a capitania que deu mais lucro". En­tão é claro que os intelectuais fo­ram vendo que eu sabia das capi­tanias e das sesmarias. Eu falo de Felipe Camarão na música e então eles começaram a perceber que não era "bota essa cerveja no bar". Aí um grande sucesso foi A Rapo­sa e As Uvas, que é uma procura por uma coisa e que tem um gan­cho na fábula de La Fontaine. Quan­do a Sony me mostrou, eles bota­ram a mão em cima: "Não, esse é inteligente, esse é craque!"

Como você está vendo esta possibilidade de uma volta do brega? Será um modismo ou con­quistará um respeito definitivo?
Eu acho que o problema é que no fundo também há uma divisão entre o tal do romântico e o brega. É impressionante. Eu é que, como tenho respaldo cultural e financeiro pra não ter medo de nada, eu falo sobre o brega e essa coisa toda. Mas os próprios garotos que não cantam o brega, principalmente lá no Norte e no Nordeste - onde as zonas estão se acabando. O român­tico talvez não fale da. cerveja: "Olha, vou rasgar tua roupa, vaga­bunda" ou "Eu vou tirar você desse lugar". Sabe? Os próprios garotos têm essa divisão entre o romântico e o brega, mas eu - como não te­nho medo de nada - assumo que o grega e o romântico são tudo igual. E "cult"... Agora, há um problema que vai acabar e essa informação pra você é boa e maravilhosa e eu vou te dar: é que não vai ter mais lugar pra Eu vou tirar você desse lugar. Porque não há mais "esse lugar", não tem mais a zona do bair­ro. Não tem mais a zona de Recife, acabou a zona. Por que? Porque as meninas começaram a dar adoida­do com 11 anos em motéis. Então todo mundo transa e não tem mais aquela iniciação, como eu tive: fa­zia 14 anos e o pai levava lá na zona. Então não tem mais aquele cenário. Não é um fato?

Esse movimento brega será mais de atitude ou será mesmo uma coisa musical?
Não há movimento brega, nun­ca existiu... Eu sempre cantei de calça jeans quando eu quero. Eu canto de smoking quando quero. Eu canto em mansões e falo; "eu" por­que há uma diferença. Eu não es­tou querendo mostrar essa diferen­ça não, mas é que tem um monte de garotos que possivelmente não têm a mesma formação que eu tive. Eu entrava cantando muitos suces­sos e, como eram muitos sucessos, alguém da casa de alguma socialite me contratava pra cantar lá porque eu era muito sucesso. Eu chegava lá e cantava McArthur Park e ou­tras canções que as pessoas enten­diam, porque havia gente curtindo. Sempre cantou-se música do povo, até os tenores agora estão. cantan­do músicas populares. Até o brasi­leiro conhece Pavarotti e Boccelli, enquanto até 20 anos atrás não se conhecia Maria Callas. Por que? Porque eles agora estão cantando música popular. (...) O cara tem que fazer alguma coisa, você tem .que se abrir um pouco. Eu estou falan­do "fui eu quem fiz" porque estou diante de um jornalista inteligente. O Brasil todo fala que fui eu quem fiz, mas eu posso deixar brecha pra você pegar o Rossi depois. Mas tal­vez eu esteja num ciclo de "fui eu quem fez" e isso soa mal, porque o brasileiro não está acostumado a falar assim.

Você não acha que hoje esta­ria trocando figurinhas com Chico Science, caso ele estivesse vivo?
Olha, eu não sei se você sabe que o pessoal dele e as outras tur­mas de jovens estão fazendo um disco intitulado "RElginaldo Rossi". Paulo André e Zé da Flauta, que foram os produtores do movimento manguebit, estão fazendo um dis­co onde cantam a turma do Chico, Cascabulho, Querosene Jacaré... Lenine pediu para participar do dis­co e Zé Ramalho também. Então, se o Chico estivesse vivo, possivel­mente estaria até encabeçando este movimento. Eu acho que tem mil gravadoras querendo, ele já está saindo. Eu estive com Astrid Fontenelle ontem e ela me disse: "Você é o cara mais roqueiro que eu já vi em toda a minha vida! Não tem nada de brega!" Outra coisa que eu acho importante falar: a Fo­lha me ligou há uns quinze dias atrás, falando que queria fazer uma reportagem de algumas páginas comigo... porque a Rossimania já havia começado em São Paulo. Eu disse "que coisa boa" e perguntei como é que era. Ela disse: "Eu fui na casa de um amigo meu, no dia em que você fez um show aqui, e ele só ouve Beatles, Black Sabbath, Iron Maiden, Sepultura e não sei o que. Eu cheguei e perguntei: 'Tá indo pra onde?'. E ele me respon­deu: 'Vou ver o show do Rossi!' 'Mas, porra, você não ouve só Black Sabbath etc?' E o cara disse: 'De­pois que eu ouvi Rossi, quebrei meus discos dos Beatles e tudo mais' " (risos) Então eu estou numa felicidade só, Marcelo!